Em um depoimento considerado um dos mais impactantes no inquérito sobre a tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022, o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica no governo Jair Bolsonaro, confirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF), na quarta-feira (21), a participação do então presidente em reuniões que discutiram uma ruptura institucional. A fala, prestada no âmbito das investigações conduzidas pelo ministro Alexandre de Moraes, expõe com detalhes a articulação de uma conspiração contra a democracia brasileira, envolvendo altas figuras do governo e das Forças Armadas.
Detalhes da trama
Baptista Júnior revelou que o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, apresentou uma minuta golpista aos comandantes das Forças Armadas, um documento que delineava ações para subverter a ordem democrática. Ele afirmou que o almirante Almir Garnier, comandante da Marinha, colocou suas tropas à disposição da trama, enquanto o grupo chegou a discutir a prisão de Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O brigadeiro destacou que a conspiração não avançou devido à falta de apoio unânime entre os comandantes militares.
Tensão entre comandantes
Um dos pontos mais graves do depoimento foi a confirmação de que o general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, ameaçou prender Jair Bolsonaro caso a proposta golpista fosse levada adiante. Segundo Baptista, a advertência foi feita com “tranquilidade e calma”, mas de forma direta: Freire Gomes daria voz de prisão ao presidente se a ilegalidade se concretizasse. Contudo, Freire Gomes, em seu próprio depoimento ao STF nesta semana, suavizou o tom, limitando-se a confirmar a existência das reuniões e descrevendo a minuta como um “estudo”, sem corroborar a ameaça de prisão.
O relato de Baptista Júnior se destacou pela clareza e incisividade. Ele descreveu a organização da trama golpista, identificando atores, métodos e estratégias, além de expor pressões internas e ataques públicos sofridos por resistir à conspiração. “Fui alvo de críticas e tentativas de intimidação, mas a falta de adesão total das Forças Armadas impediu o golpe”, declarou. Seu depoimento converge com outros elementos das investigações, como documentos apreendidos e relatos de testemunhas, ajudando a montar o quebra-cabeça de uma das maiores ameaças à democracia brasileira nas últimas décadas.
Impacto e contexto
O depoimento do ex-comandante da Aeronáutica é um marco no inquérito conduzido pelo STF, que apura a tentativa de golpe após a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022. A minuta golpista, as reuniões no Palácio da Alvorada e a mobilização de setores das Forças Armadas já haviam sido mencionadas em outras fases da investigação, mas o relato de Baptista Júnior oferece uma visão estruturada e detalhada, conectando decisões, omissões e os bastidores da conspiração. A menção à possibilidade de prisão de Alexandre de Moraes reforça a gravidade do plano, que visava neutralizar instituições democráticas.
A resistência de comandantes como Baptista Júnior e Freire Gomes foi crucial para evitar a ruptura institucional, mas a disposição de figuras como Garnier e Nogueira em apoiar a trama expõe a fragilidade das instituições diante de pressões antidemocráticas. O depoimento também lança luz sobre a pressão exercida sobre militares que se opuseram ao golpe, evidenciando o clima de intimidação no período pós-eleitoral.
Perspectivas
O relato de Baptista Júnior fortalece a linha de investigação do STF e deve intensificar a responsabilização dos envolvidos, incluindo figuras centrais do governo Bolsonaro. A clareza do depoimento, aliada à sua convergência com outras provas, reforça a narrativa de uma conspiração orquestrada para subverter a vontade popular expressa nas urnas. O inquérito, que já resultou em prisões e indiciamentos, ganha um impulso significativo com essas revelações, aproximando-se de desfechos judiciais que podem marcar a história política do país.
A sociedade brasileira acompanha com atenção os desdobramentos do caso, que testam a resiliência das instituições democráticas. O depoimento de Baptista Júnior não apenas esclarece os eventos de 2022, mas também serve como um alerta sobre a necessidade de proteger a democracia contra ameaças autoritárias, reforçando o papel do STF na defesa do Estado de Direito.