O São João da Bahia em 2025, tradicionalmente marcado pelo som da sanfona e do forró, tem chamado atenção por uma mudança no perfil das atrações, com o DJ Alok, ícone da música eletrônica, garantindo cachês milionários em duas cidades. Segundo o Painel de Transparência dos Festejos Juninos, divulgado pelo Ministério Público da Bahia (MPBA) no domingo (1º), Alok receberá R$ 750 mil por cada apresentação em Irecê (21 de junho) e Jequié (20 de junho), totalizando R$ 1,5 milhão, pagos com recursos municipais. Um terceiro show em Serrinha (24 de junho) também está confirmado, mas não consta no painel. A presença de Alok reflete uma tendência de diversificação musical, enquanto o forró, gênero símbolo do São João, enfrenta declínio em contratações, superado pelo arrocha.
Alok e os altos cachês
A escolha de Alok por prefeituras de Irecê e Jequié gerou debate, especialmente pelo alto investimento em um artista de música eletrônica em um festejo historicamente ligado ao forró. Os R$ 1,5 milhão destinados aos dois shows equivalem a quase metade do faturamento de Batista Lima, um dos forrozeiros mais contratados, que acumula R$ 3,4 milhões por 19 apresentações. A participação de Alok, conhecido por hits como “Hear Me Now” e por atrair multidões em festivais globais, sinaliza a aposta das cidades em atrair um público jovem e diversificar o São João, mas também levanta questões sobre o uso de recursos públicos em eventos culturais.
Além dos shows confirmados em Irecê e Jequié, Alok se apresentará em Serrinha, embora detalhes sobre o cachê e a fonte de pagamento não tenham sido divulgados pelo MPBA. As contratações do DJ, que acumula mais de 20 milhões de ouvintes mensais no Spotify, refletem a crescente influência de gêneros não tradicionais nos festejos juninos, em um momento em que o forró luta para manter sua relevância.
Forró em declínio
O Painel de Transparência do MPBA expõe uma mudança significativa no cenário musical do São João baiano. Das dez atrações mais contratadas para os festejos de 2025, apenas três — Batista Lima, Mastruz com Leite e Calcinha Preta — representam o forró, enquanto as demais, lideradas por bandas de arrocha como Toque Dez, dominam o ranking. Toque Dez encabeça a lista com 39 shows e R$ 11,2 milhões em cachês, seguida por Tayrone (23 shows, R$ 6,5 milhões) e Devinho Novaes (22 shows, R$ 4,5 milhões). Calcinha Preta, a única banda de forró no top 10, aparece em décimo, com 14 shows e R$ 6,8 milhões.
O declínio do forró, gênero que historicamente define o São João, preocupa artistas e produtores culturais. “O forró é a essência da festa, mas está sendo ofuscado por outros estilos. Precisamos de políticas que valorizem nossas raízes”, afirmou o vocalista de Mastruz com Leite, Neto Leite, em entrevista recente. A ascensão do arrocha, com seu apelo popular e letras românticas, reflete a preferência de parte do público jovem, mas também evidencia a falta de incentivos para bandas de forró tradicional, como trios pé-de-serra, que raramente aparecem nas grades principais.
Painel de Transparência
O Painel de Transparência, iniciativa do MPBA em parceria com o Ministério Público de Contas, Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios, Rede de Controle da Gestão Pública e entidades como a União dos Municípios da Bahia (UPB) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA), monitora os gastos com festejos juninos entre 1º de maio e 30 de julho. Até o momento, 362 dos 417 municípios baianos enviaram dados, registrando a contratação de 1.020 artistas por R$ 357 milhões. O prazo para envio de informações foi prorrogado até sexta-feira (6), após o término original em 31 de maio.
A ferramenta, lançada para promover transparência e eficiência na gestão pública, permite que cidadãos acompanhem os investimentos em tempo real. Municípios que contribuem com dados recebem um selo de boas práticas de governança, incentivo que tem aumentado a adesão. “O painel é um passo importante para garantir que os recursos sejam usados com responsabilidade, fortalecendo a cultura e o turismo”, destacou a promotora de Justiça Rita Tourinho, coordenadora do projeto.
Impacto econômico e cultural
O São João da Bahia é um dos maiores eventos culturais do Brasil, movimentando cerca de R$ 1 bilhão na economia estadual, segundo a Secretaria de Turismo da Bahia. Em 2024, os festejos geraram 100 mil empregos temporários, e a edição de 2025, com apoio do governo estadual a 223 municípios, promete números ainda maiores. No entanto, a predominância de gêneros como arrocha e a contratação de artistas como Alok levantam discussões sobre a identidade cultural do São João, que historicamente celebra o forró e manifestações tradicionais como quadrilhas e reisados.
Cidades como Irecê e Jequié, que investiram pesado em Alok, defendem a diversificação como forma de atrair turistas e impulsionar a economia local. “O São João precisa se reinventar para dialogar com as novas gerações. Alok traz um público que movimenta hotéis, restaurantes e comércio”, justificou o prefeito de Irecê, Elmo Vaz. Críticos, porém, argumentam que os altos cachês desviam recursos que poderiam ser usados para apoiar artistas locais e preservar a cultura nordestina.
Perspectivas
A presença de Alok no São João de 2025 simboliza a encruzilhada cultural dos festejos baianos, entre a preservação do forró e a abertura para novos estilos. Enquanto o Painel de Transparência do MPBA garante maior controle sobre os gastos, a escolha de atrações como Toque Dez e Alok reflete a busca por inovação, mas também expõe a necessidade de políticas públicas que equilibrem tradição e modernidade. Para os amantes do forró, resta a esperança de que o gênero recupere seu espaço, enquanto o São João da Bahia segue como um dos maiores palcos da diversidade musical do Brasil.
Top 10 das atrações mais contratadas
- Toque Dez: 39 shows (R$ 11,2 milhões)
- Tayrone: 23 shows (R$ 6,5 milhões)
- Devinho Novaes: 22 shows (R$ 4,5 milhões)
- Batista Lima: 19 shows (R$ 3,4 milhões)
- Silfarley: 19 shows (R$ 3,5 milhões)
- Mastruz com Leite: 17 shows (R$ 3,8 milhões)
- Unha Pintada: 17 shows (R$ 5,6 milhões)
- Natanzinho Lima: 16 shows (R$ 9 milhões)
- Thiago Aquino: 16 shows (R$ 4,4 milhões)
- Calcinha Preta: 14 shows (R$ 6,8 milhões)