Robert Francis Prevost é eleito Papa Leão XIV, primeiro pontífice norte-americano da histó

Em um marco histórico, o cardeal Robert Francis Prevost, de 69 anos, foi eleito o 267º papa da Igreja Católica, adotando o nome Leão XIV. A escolha, anunciada na tarde desta quinta-feira após quatro escrutínios no conclave da Capela Sistina, rompeu com séculos de tradição ao consagrar o primeiro pontífice nascido nos Estados Unidos. A fumaça branca, sinal de consenso entre os 133 cardeais eleitores, emergiu às 13h07 (horário de Brasília), seguida pelo anúncio do cardeal protodiácono Dominique Mamberti: “Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus Papam!”. Minutos depois, Leão XIV apareceu na sacada da Basílica de São Pedro, saudando milhares de fiéis com a bênção Urbi et Orbi e um discurso que pediu “paz desarmada” e uma Igreja que “constrói pontes”.

Natural de Chicago, Prevost é um agostiniano com uma trajetória marcada por sua atuação missionária no Peru, onde adquiriu cidadania em 2015, e por sua ascensão meteórica na Cúria Romana sob o pontificado de Francisco, falecido em 21 de abril. Considerado um moderado com inclinação pastoral, ele herda a liderança de 1,4 bilhão de católicos em um momento de divisões internas na Igreja e desafios globais, como a perda de fiéis, crises financeiras e a gestão de escândalos de abusos sexuais. Sua eleição, vista como uma surpresa diante de favoritos como o italiano Pietro Parolin e o filipino Luis Antonio Tagle, reflete a influência do legado de Francisco, que nomeou 80% dos cardeais eleitores.

Uma trajetória global e pastoral

Nascido em 14 de setembro de 1955, Robert Francis Prevost é filho de Louis Marius Prevost, de ascendência francesa e italiana, e Mildred Martínez, de origem espanhola. Formado em Matemática pela Universidade Villanova, ele ingressou na Ordem de Santo Agostinho em 1977, emitindo votos solenes em 1981 e sendo ordenado padre em 1982. Sua formação inclui um mestrado em Teologia pela Catholic Theological Union, em Chicago, e um doutorado em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade de Santo Tomás de Aquino, em Roma.

Prevost construiu grande parte de sua carreira no Peru, onde atuou como missionário, pároco, professor de seminário e vigário judicial entre 1985 e 1998. Retornou aos EUA como superior provincial dos agostinianos e, de 2001 a 2013, foi prior geral da ordem, liderando-a globalmente. Em 2014, tornou-se bispo de Chiclayo, no Peru, e, em 2018, vice-presidente da Conferência Episcopal Peruana, destacando-se na mediação de crises políticas. Desde 2023, ocupava o cargo de prefeito do Dicastério para os Bispos, um dos mais influentes da Santa Sé, responsável por nomear bispos em todo o mundo, e presidia a Comissão Pontifícia para a América Latina.

Sua proximidade com Francisco, que o elevou a cardeal em 2023, posicionou-o como um “construtor de pontes” entre as alas progressistas e conservadoras da Igreja. No Dicastério, Prevost apoiou a inclusão de três mulheres no processo de nomeação de bispos, uma reforma revolucionária de Francisco, mas manteve posições ortodoxas em temas como aborto e direitos LGBTQIA+, expressando resistência a políticas de inclusão de gênero em escolas peruanas.

A eleição e o contexto do conclave

O conclave, iniciado em 7 de maio, foi o mais diverso da história, com cardeais de 71 países, incluindo sete brasileiros: Paulo Cezar Costa, Leonardo Ulrich Steiner, Odilo Scherer, Jaime Spengler, Sérgio da Rocha, Orani Tempesta e João Braz de Aviz. Após duas rodadas de fumaça preta, indicando ausência de consenso, Prevost alcançou os 89 votos necessários (dois terços dos 133 eleitores) na quarta votação, em menos de 24 horas – um processo rápido, similar às eleições de Bento XVI (2005) e Francisco (2013).

A escolha de Prevost desafiou expectativas, já que a eleição de um norte-americano era considerada improvável devido ao peso geopolítico dos EUA. No entanto, sua experiência missionária no Peru, fluência em espanhol e italiano, e perfil discreto, descrito pelo jornal La Repubblica como “o menos americano dos americanos”, conquistaram os cardeais. Sua nomeação ao Dicastério para os Bispos e sua integração em sete dicastérios vaticanos deram-lhe visibilidade e credibilidade, enquanto seu passado agostiniano evocou a humildade pastoral de Santo Agostinho.

Em seu primeiro discurso, Leão XIV agradeceu a Francisco, cujo pontificado foi marcado por inclusão, defesa dos pobres e combate aos abusos clericais. “O mundo precisa de pontes, de diálogo, de unidade. Sigamos sem medo, guiados por Cristo”, declarou, sinalizando continuidade com a agenda social de seu antecessor, mas com um tom mais sereno, segundo o padre Alejandro Moral Antón, ex-líder dos agostinianos.

Desafios e controvérsias

Leão XIV assume o papado em um cenário complexo. A Igreja enfrenta uma queda gradual de fiéis, especialmente na Europa e nas Américas, e crises financeiras, com dificuldades para sustentar aposentadorias clericais e administrar o déficit do Vaticano. A gestão de escândalos de abusos sexuais, um dos legados mais sensíveis de Francisco, também estará no centro de seu pontificado. Prevost já enfrentou críticas nesse âmbito: em 2023, três mulheres no Peru acusaram-no de demora em agir contra padres denunciados por abusos na década de 1990, e, em Chicago, ativistas questionaram sua decisão, como líder agostiniano, de acolher um padre acusado de pedofilia em um mosteiro próximo a uma escola católica em 2000. A diocese de Chiclayo e seus defensores negam acobertamento, afirmando que Prevost seguiu os protocolos canônicos, mas as acusações seguem em investigação no Vaticano.

Sua postura pastoral, moldada por décadas no Peru, é um ponto forte. Prevost apoiou imigrantes venezuelanos e visitou comunidades remotas, ganhando elogios por sua empatia. Contudo, suas visões conservadoras sobre aborto e diversidade de gênero, alinhadas à doutrina tradicional, podem gerar tensões com setores progressistas que esperam avanços na inclusão de pessoas LGBTQIA+.

Um pontificado de pontes e tensões

A eleição de Leão XIV, saudada por fiéis na Praça de São Pedro e comentada globalmente, marca um novo capítulo para a Igreja. Jornais como The New York Times destacaram a escolha como um “momento marcante” em meio às divisões internas, enquanto o peruano El Peruano celebrou sua trajetória em Chiclayo como um símbolo da influência latino-americana. O ex-presidente dos EUA, Donald Trump, chamou a eleição de “grande honra” para o país, embora analistas prevejam atritos com o Vaticano devido às diferenças ideológicas de Prevost com a agenda trumpista.

Com o lema “In Illo unum uno” (“No único Cristo, somos um”), Leão XIV sinaliza uma Igreja unida, mas enfrenta o desafio de equilibrar tradição e modernidade. “Ele é um líder pastoral, mas firme. Sabe ouvir, mas não hesita em decidir”, afirmou o reverendo Michele Falcone, agostiniano que o conhece há décadas. Enquanto Roma celebra seu novo pastor, o mundo observa como Leão XIV conduzirá a Igreja em tempos de transformação, carregando a ambivalência de ser norte-americano, peruano, progressista em questões sociais e conservador em doutrina.

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